O solo é base da agricultura. Nele semeamos nossos cultivos que são “alimentados” pelos nutrientes contidos na terra. Por isso, cuidar bem do solo é essencial para a continuidade e a sustentabilidade dos sistemas de produção agrícola.
Sabemos que existem ferramentas, sistemas e tecnologias que permitem explorar a terra sem destruí-la. Para entender melhor a importância dos solos férteis e bem conservados, conversamos com o doutor em manejo do solo e pesquisador da Embrapa Soja, Henrique Debiase.
O que define um bom solo? Quais são suas principais características?
Um solo bom, deve ter características físicas, químicas e biológicas que favoreçam o desenvolvimento das plantas, promovam a infiltração de água e, também, diminua a emissão de gases causadores do efeito estufa.
Um solo fértil, deve ter em primeiro lugar adequadas características físicas: baixo grau de compactação, boa estrutura, boa capacidade de infiltração e armazenamento de água. Ele também deve disponibilizar todos os nutrientes, em equilíbrio e nas quantidades necessárias, para as plantas. Mas, talvez, o ponto mais importante seja a questão da biologia. Um solo fértil é o solo que é biologicamente ativo (com a presença de macro e microrganismos). Assim, todo o manejo do sistema de produção deve ser voltado para ativar o solo biologicamente. A principal prática de manejo que faz com que o solo se torne ativo biologicamente, é a adoção do sistema plantio direto, na essência da expressão.
O que é o sistema plantio direto e quais os benefícios dele para o solo?
O plantio direto é um sistema de produção em que a semeadura das culturas é feita sem revolvimento do solo, sem preparo do solo em área total. O sistema deve atender a 3 requisitos principais: o mínimo revolvimento do solo – ou seja, revolvendo o solo apenas na linha de semeadura; a cobertura permanente – seja com plantas vivas ou com palha (restos de lavouras ou adubos verdes); e a diversificação de culturas, incluindo aí plantas de diferentes espécies, diferentes famílias e com diferentes características de sistema radicular (raízes) e com produção de biomassa da parte aérea (folhas, flores, caules, frutos).
Os principais benefícios do sistema plantio direto para a produção são a conservação do solo e da água, com redução em até 95% dos processos erosivos. Além disso, no médio e longo prazo, o sistema plantio direto adotado de acordo com os 3 fundamentos básicos, permite mais armazenamento de água no solo, maior crescimento radicular, diminui as perdas de água por evaporação, aumenta a disponibilidade de nutrientes e torna o solo mais ativo biologicamente. Isso se traduz em aumento de produtividade, redução de custos e, principalmente, na redução dos impactos ambientais da agricultura.
O sistema plantio direto já tem boa adoção no Brasil?
O sistema plantio direto hoje é o sistema de manejo do solo mais recomendado dentro da definição de agricultura conservacionista. Ele é utilizado em cerca de 90% da área de grãos no Brasil. No entanto, na maioria das áreas, podemos evoluir no sentido de adotar o sistema em sua plenitude, principalmente, no que se refere à diversificação de culturas. Ainda podemos melhorar a qualidade do sistema.
No Brasil como um todo, temos o predomínio de sistemas de produção pouco diversificados: milho e soja nas regiões mais quentes ou trigo e soja nas áreas mais frias. E temos muitas áreas de pousio no outono/inverno (estação seca ou mais fria do ano) e soja no verão. E isso pode ser melhorado.
Além do plantio direto, o que mais pode ser feito pela conservação do solo?
A agricultura conservacionista envolve, além do sistema plantio direto, outras práticas de manejo que devem ser adotadas integradas. As principais envolvem práticas de contenção do escoamento superficial de água. No Brasil, mesmo com solo bom, nós podemos ter chuva com intensidade muito elevada, acima da capacidade de infiltração de água no solo, gerando escoamento.
Portanto, além do plantio direto, precisamos ter nas áreas agrícolas um sistema adequado de terraços para que conter esse escoamento, evitando erosão. E, junto com terraceamento, a realização de operações mecanizadas deve ser feita seguindo o nível do terreno. Por exemplo, no plantio cada linha de semeadura vai funcionar como um micro terraço, se ela for feita em nível.
O que o agricultor ganha fazendo uma boa conservação de solo?
Os resultados envolvem aspectos econômicos, ambientais e, inclusive, sociais. Com um bom solo, um solo fértil – do ponto de vista físico, químico e biológico – é possível obter altas produtividades (produção por área), reduzindo o risco de perdas em anos secos, diminuindo os custos de produção – principalmente com fertilizantes e herbicidas – e, em virtude de tudo isso, reduzir o impacto ambiental da agricultura pela maior eficiência de uso de insumos, pelo próprio aumento da produtividade e pela conservação do solo.
A população mundial vem crescendo e, consequentemente, consumindo cada vez mais. Ao mesmo tempo, a disponibilidade de terras para agricultura é limitada. Como equilibrar essa conta?
O grande desafio da agricultura é produzir cada vez mais alimentos, fibras e proteínas animais em uma área escassa. Ou seja, nós temos limitações para o aumento de área, e, ao mesmo tempo, enfrentamos pressões para a conservação ambiental. Nesse ponto, a preservação do solo é a base para se atingir a chamada “intensificação sustentável”. Nada mais é do que aumentar a produção por área (produtividade) preservando o solo, o ar e água para as gerações futuras.
Então, tecnologias como novas cultivares, sistemas integrados de produção e ferramentas digitais de gerenciamento das propriedades serão essenciais para que se atinja essa intensificação sustentável, levando ao aumento da produção sem aumento expressivo na área cultivada.